sexta-feira, 10 de agosto de 2007

Sérias 12

Dois achados num dia limpo

- Tudo de cabeça pra baixo, pernas pro ar. Levanta as mãos pros céus e teme. Agradecer pela desgraça perdeu a graça; custa caro e não sai barato.
- Nem o faria, ando meio parada. Reflexo cintilante de minha cinza obscuridade. Parei pra refletir esses dias, sabe. Conclui? Conclui que há um conluio pela quebra dos espelhos da reflexão sendo arquitetado pelas nossas costas, pelas nossas sombras. Veio na boca um gosto cuspido, como se nada em mim repousasse inquietante e depois fugisse, disparatado escapasse para ser bolhas de idéia no ar. Olhei à minha volta e sorri quadrado; circulavam milhares de rosto e corpos, nenhuma pessoa. Todo mundo de pé atrás, pé à frente, passeando sem passado, sem futuro, refratários. O pensamento em permanente presente. E a reflexão? O papel de cada um não é absorvente, entende?
- Daí se encima esse céu apagado, sorrindo aqui pra gente, opaco – nenhuma luz lá no alto e aqui esse tapete humano cabisbaixo. Entendo. Não te deu vontade de se ausentar pelo ar? A mim sempre ocorre, em circunstâncias repentinas, com as suas parecidas, esconder-me dentro de um tubo aerosol. Ser pichado por aí, um pouco em cada canto, em muros erguidos e monumentos tombados e...
- ... e virar um ser estampado? Pelos gritos uivados que não! Ninguém merece estar pendurado, em molduras intactas pregado aos olhos em trânsito dos cães cegos e seus guias apressados. Pra ser bajulado feito vitrine basta continuar andando, devagar e com pelo menos o dobro de seus quilos em brilhantes penduricalhos – como vão amarrados ao pescoço, eis mais um motivo pra se andar curvado. Eu queria ser água.
- Concordo em gênero, estado físico e grau. Pra beber, tomar como chuva e me afogar mergulhado. E, além de matar minha sede em meio a esse deserto de vidas granuladas, colaria todo seu conteúdo no primeiro lança perfume a que meu nariz aspirasse. Borrifadas de seu ardor nos olhos dos outros seria refresco.
- Besta... Era outra coisa, imensa, oceânica. Escorrer pelo ralo, sabe? Pelo ralo não, pela enxurrada. Pela enxurrada que deságua sua água suja em qualquer córrego esquálido. Serpentearia por todo ele em busca de um rio de águas violentas – nada de passividade, mansidão, basta-me de calmaria nossas calçadas. E aí, o derradeiro derramamento: o mar. Eu seria a maresia inavegável, com braços que fariam ondas pra abraçar o céu, peitando as curvas do vento lá onde suas retas fazem horizontes. E o que mais restaria a minha face intranqüila? Refletir todo aquele céu até que as cores de nossa alma se confundissem, claro.

- E eu? Fico aqui, plantado feito poste, dando a luz artificial aos paridos retratos cinzas de rostos desfocados?
- Entre nossos milhões somos números rarefeitos pelo concreto que respira. Antes uma gota no oceano. Vem...