sábado, 19 de abril de 2008

Sérias 16

Chegou com as línguas nas canelas, o peito falando pelas palavras, a pele molhada em dégradé oleoginoso. Desabafou, pulmonar:
- Mais?
- Ou menos, depende - declamou o da frente, impávido nos gestos, sutil nos movimentos das sobrancelhas.
Com as mãos segurando os joelhos e os joelhos suportando o corpo, tossiu:
- Maior, talvez?
- Menor, maior, na medida certa, quem sabe? - replicou o do lado, sem remeter o olhar ao inquisidor, menos preocupado com o espaço das coisas do que com as coisas do espaço.
Ajustando o ângulo da coluna às energias do tórax, buscou respostas oxigenadas. À esquerda:
- Para o alto?
- E avante? Não seja ridículo. Para baixo ou para trás, em linha reta ou perdido nas curvas, de pernas pro ar ou de cócoras pro sol: o que importa é a trajetória do projétil A do ponto X ao ponto Y. Entendeu A? Ou vou ter que te ensinar o beabá?
O cansaço foi substituído pela ânsia. Em busca de informações, exasperou:
-Melhor?
Todos à volta resolveram lhe dar a requerida atenção.
Um:
- O melhor morreu de febre superlativa.
Outro:
- O pior de anemia, carência de superlativos e objetivos no sangue, de sangue irrigando a cabeça.
O de trás, aos pulos:
- Bom para o mau, que vive dos restos de ambos.
Quem pairava ali por cima parou para opinar:
- E mau para o bom, que no começo lamentava as fatalidades, e hoje lamenta por lamentar. Sem parar.
Os olhos arregalados estavam assustados - era o que se percebia pela boca aberta. Tentou, ainda:
- E então, qual o caminho?
Todos continuaram parados, rodeados por um sereno fino e gelado. Ele, a correr. Por todas as direções possíveis e, às vezes, pelas impossíveis. Quando pára, pergunta: maior? mais? melhor? por onde?