quarta-feira, 26 de outubro de 2011

breves eternidades 4

Existe uma distância segura entre nós e eu a chamo de abismo.

Caí dentro de você como quem dorme um sono profundo. Voei por ali, entre corpos, palavras e pulsações nem tão incômodas quanto as sombras dos secos arbustos que, caídos sobre o penhasco, fora de nós, iluminavam todo aquele universo ao redor da minha queda. Tive medo de sair e me flagrei ansioso por continuar a cair. Era um tempo tão suspenso que se o contasse em segundos me faltariam uns dez infinitos nas mãos.

Acordar foi ter de conviver com um sono eterno. Não que me veja raso ou sonâmbulo, mas não me aproximar demais, mergulhar, quero dizer, derruba o que sobra de consciência. Me falta consistência. Pisco e apago. E desperto faço as contas enquanto derramo bocejos na bacia de lágrimas que encharcam meus pés. Não chego a resultado nenhum: sem cálculos possíveis para refazer a ponte entre o que eu era e o que você foi para mim. Que continuem chorando o solo que me suporta e a solidão que sua aridez me impôs. Lanço um aceno, recebo do outro lado mais lados e nenhum todo.

Não existe nenhuma distância entre nós a não ser àquela imposta por duas solidões que já se abraçaram e se jogaram inseguras em queda livre para nenhum rumo. Eu gosto de chamar essa distância que não existe entre nós de abismo.