sábado, 24 de julho de 2010

Ocasionais 3

Só escreve uma carta de amor, meu amor, quem tem um endereço conhecido. Fica no quarto ao lado da janela fechada pela inconveniência dos uivos do sol que insistem em atrapalhar minha escrita com lembranças de horizontes abraçados ao toque de seus dedos. Em cima da mesa, sob o chão empoeirado de lágrimas que mais parecem cera de velas apagadas por lágrimas de um remetente qualquer. Você conhece, tem as chaves da porta da cozinha e pernas fortes para arrombar a parede do quarto que separa minhas palavras no papel de seus olhos cínicos e inclementes.

Sim, meu amor, para rejeitar uma carta de amor você precisará mais do que uma caixa de correio impenetrável. Se a qualquer um bastasse apenas o endereço desencontrado, um carteiro desavisado ou a miopia repentina, nenhuma carta de amor seria forjada, arrancada, martelada, chorada, escrita, maldita.. Vai precisar se recolher na violência da indiferença patrocinada pelos rancores mais viscosos – não, não quero, não basta.

Com amor,

seu remetente...

Nenhum comentário: